Objeto Gritante .

Objeto Gritante - Mauricio de Oliveira & Siameses


Dia: 29/05
Hora: 18h
Local: Teatro de Dança - SP
Duração: 1h



   A minha escolha da data para ver o espetáculo dos Siameses, com coreografia de Maurício de Oliveira, me remete a tristes pensamentos sobre a dança no Brasil. O “fim” do Teatro de Dança em São Paulo representa mais que uma perda de espaço cênico para a dança, mas uma falta de respeito a quem leva a arte como escolha de vida e que leva a prática de alertar, divertir e refletir o eu-interior verdadeiramente a sério.
   O espetáculo, com um cenário simples mas com uma riqueza imensa de detalhes, com objetos cênicos esculturados em espuma, assim como as máscaras usadas, de responsabilidade criativa do artista plástico Duda Paiva, com bailarinos com extrema capacidade técnica e interpretativa, e com um trabalho de voz e teatro, confirmou as expectativas como o último trabalho a ser apresentado no Teatro de Dança. 
   Todo o trabalho tinha uma movimentação forte, ora lenta, ora rápida, mas sempre muito articulada. Era impossível não reparar nos músculos dos intérpretes trabalhando em cada movimentação. Além da dança, o espetáculo tem texto livremente adaptado do livro Carta Para Atores, do francês Valère Novarina e um dos destaques é o trabalho de voz do bailarino entrando com as máscaras de espuma no palco, inventando diversas personalidades e interpretando de forma belíssima cada uma delas.

   Os dois intérpretes eram masculinos, contrariando o programa entregue, pois o trabalho originalmente foi concebido para a bailarina Marina Salgado que se machucou e teve de ser operada. Então, Ditto Leite assumiu o posto e atuou ao lado de Maurício de Oliveira, e de forma espetacular.
   As músicas do espetáculo são todas líricas e muito calmas, o que chega a criar um certo desespero (em mim, particularmente), pois os bailarinos se movem tão lentamente e precisamente que parece interminável, e apesar de parecerem leves, a força necessária para realizar os movimentos que fazem nessa velocidade é extrema.
  O espetáculo é uma reflexão sobre as máscaras sociais e como nós nos utilizamos dessas máscaras para se adaptar a sociedade, o que eu particularmente entendo como "falsidade momentânea", o que é preciso para se encaixar naquele padrão naquele determinado momento. Mas também traz a questão do artista, da função do artista em cena, dessa necessidade de transparecer os sentimentos diariamente de nos desvendarmos, de cifrar e decifrar o nosso ser em nome de uma transparência. E as perguntas que ficam em tudo isso é: para quê? para quem? para onde? qual a necessidade de se movimentar em nome dessa transparência?
   Ao fim do espetáculo o intérprete e criador, Mauricio de Oliveira, disse algumas palavras sobre a tristeza de ver mais um espaço da dança ser levado embora, e sobre a esperança de melhores verbas e condições para cias pequenas e que trabalham a um tempo nesse ramo, geralmente esquecidas pelo governo. Foi emocionante para alguém que decide viver a vida dessa arte de se mover, e que ve um espaço que era "meu", um espaço "nosso" ser retirado sem troca, reforma ou mesmo contradição.